Bastam alguns segundos observando o fluxo de veículos para flagrarmos pessoas conduzindo enquanto falam ou manuseiam o telefone celular, criando uma situação de risco e isso tem sido algo crescente, sobretudo nos últimos anos, em razão da evolução e popularização destes aparelhos.
A lei não acompanhou o avanço tecnológico. Telefone celular no trânsito
A Lei n° 9.503, que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro, foi sancionada em 23 de setembro de 1997, entrando em vigor cento e vinte dias após a sua publicação, especificamente em 22 de janeiro de 1998. No entanto, o Projeto de Lei n° 3710 que se transformou no CTB, é do ano de 1993, ou seja, antes da metade da década de 90 e o cenário da telefonia era bem diferente. Telefone celular no trânsito
Aqueles que têm 30 anos de idade ou mais, acompanharam essa evolução e conhecem bem a realidade dos telefones celulares daquela época. Era inimaginável para a maioria que passássemos a ter as funcionalidades que conhecemos hoje na palma da mão. Porém, toda essa evolução, utilizada de forma inadequada no trânsito, tem trazido problemas.
Para se ter ideia, condutores que utilizaram o telefone celular enquanto estavam na direção do veículo foram responsáveis por cerca de 54 mil acidentes no ano de 2018, segundo dados da Seguradora Líder, que administra o Seguro DPVAT e da ABRAMET.
Punições aplicáveis
A sanção inicialmente prevista pela legislação de trânsito para as situações envolvendo o telefone celular era um tanto branda. De acordo com o art. 252, VI, do CTB, é infração de natureza MÉDIA dirigir o veículo utilizando-se de telefone celular, sendo registrados 4 pontos no prontuário do infrator e multa de R$ 130,16.
Somente no ano de 2016, a partir de 01 de novembro, com a entrada em vigor da Lei n° 13.281, que incluiu o parágrafo único ao art. 252 do CTB, cuja redação um tanto confusa, estabelece: “A hipótese prevista no inciso V caracterizar-se-á como infração gravíssima no caso de o condutor estar segurando ou manuseando telefone celular”. O inciso V que o tipo infracional se refere é a infração por conduzir somente com uma das mãos ao volante, que também é de natureza média, mas se torna gravíssima, com 7 pontos e multa de R$ 293,47 em razão do celular.
No entanto, a criação desse novo tipo infracional, tirar uma das mãos do volante para segurar ou manusear o telefone celular, foi justamente com o intuito de punir com mais rigor aquele que desvia a atenção do trânsito e a direciona para o aparelho, que evoluiu de tal forma que possui inúmeras funcionalidades em comparação aos da época da tramitação do projeto de lei que se transformou no CTB.
Maior rigor na lei, não coibiu a conduta
Mesmo com a mudança, somente no ano de 2018 foram mais de 507 mil infrações cometidas e de janeiro a agosto de 2019, já são mais de 330 mil infrações relacionadas ao telefone celular, de acordo com dados do Departamento Nacional de Trânsito. Isso dá uma média de quase uma infração por minuto, lavrada pelos órgãos de trânsito pelo país.
Algumas pessoas talvez aleguem, em defesa própria, que os números são reflexo da famigerada “indústria da multa”, mas como dissemos no início do texto, basta olhar o trânsito por alguns minutos que esse argumento não mais existirá.
Divergentes interpretações da Lei
Alguns aspectos merecem ser discutidos, como por exemplo, os diferentes enquadramentos relacionados ao telefone celular.
Não há dúvida, no caso daquele que apoia o telefone no ombro e no ouvido, ou encaixa no capacete para ficar junto ao ouvido, pois, nessa hipótese, o condutor está cometendo infração de natureza média (art. 252, VI, do CTB). Já os condutores que são flagrados digitando no celular estão cometendo infração gravíssima (art. 252, parágrafo único, do CTB).
Discute-se, ainda, sobre a conduta daquele que segura com a mão o telefone junto ao ouvido. Alguns defendem se tratar de infração gravíssima, por “segurar o aparelho”, enquanto outros entendem que ocorre o cometimento de infração média, pelo “uso do telefone”.
Fazendo uso da hermenêutica jurídica – uma forma de compreensão e interpretação das normas – apelando especificamente para a interpretação teleológica, que busca compreender a FINALIDADE da norma, ou seja, o que pretendia o legislador quando da criação do regramento, defendemos o entendimento de que se a intenção fosse punir a utilização mais comum do telefone celular (segurando o aparelho com a mão junto ao ouvido) como infração de natureza gravíssima, então bastaria modificar o inciso VI do art. 252 e não criar um novo tipo infracional.
Portanto, aquele que lê ou digita algo no celular comete infração gravíssima por segurar ou manusear, enquanto aquele que segura junto ao ouvido está cometendo infração média pelo uso do celular.
Evidentemente que nosso posicionamento não é absoluto, há entendimentos contrários e que respeitamos, mas, somente com a publicação da ficha desse enquadramento o procedimento será definido.
Utilização do Bluetooth
Outra questão bem discutida é a utilização do telefone celular através do bluetooth. Não iremos nos atrever a explicar aspectos técnicos sobre percepção, pois não é nossa área. Mas, sob o ponto de vista legal, a utilização do telefone através do sistema de bluetooth disponível no veículo configura infração pelo “uso do telefone celular” – como se depreende da leitura do art. 252, VI, do CTB.
No entanto, é absolutamente improvável que o Agente de Trânsito consiga constatar o cometimento dessa infração de maneira inequívoca, pois não há como saber se o condutor está cantando uma música que toca no rádio ou falando ao celular – razão pela qual, NÃO se deve autuar.
Em 2002 o DENATRAN chegou a publicar a Portaria nº 24 que entendia ser inexistente a infração pelo uso de aparelho de fone de ouvido, do tipo monoauricular, quando da condução de veículo automotor. Mas a norma foi tornada sem efeito pela Portaria nº 48, no mesmo ano.
Utilização de GPS pelo celular
Algumas pessoas utilizam nos smartphones aplicativos de navegação enquanto dirigem, a exemplo do Google Maps e do Waze. Nesse caso, entendemos não se tratar de infração, desde que não haja manuseio durante a condução, pois a rota pode ser programada antes mesmo de sair com o veículo.
Inclusive, a Resolução n° 242/2007 do CONTRAN permite a utilização de aparelho gerador de imagem cartográfica com interface de geoprocessamento destinado a auxiliar na indicação de trajetos ou orientar sobre as condições da via, por intermédio de mapas, imagens e símbolos.
Esses equipamentos podem ser previstos pelo fabricante ou instalados no habitáculo do veículo em caráter provisório, podendo ser fixados no pára-brisa ou painel dianteiro. A proibição expressa ocorre quando da instalação desse tipo de equipamento para fins de entretenimento, assim como prevê a citada resolução.
Aplicativos e modo avião
A fim de evitar transtornos, alguns aplicativos podem ser instalados no smartphone para impedir que o condutor receba ligações enquanto dirige.
Até mesmo o próprio aparelho pode ser programado para o modo avião, o condutor pode ter autocontrole e não atender ligações enquanto estiver dirigindo ou no caso de uma ligação urgente procurar um local permitido em que possa parar seu veículo e atender.
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